quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Um pedido para Adeline

São poucos e únicos os livros com os quais tenho intimidade. Puxo um, lembro, puxo o outro da estante em seguida; todos da prateleira dedicada aos livros de VW (os que já li). Os coloco lado a lado; quando passo, vibro baixinho, sinto uma pontada de satisfação por ter lido aquelas palavras tão inequivocamente unidas para sempre, de uma forma singular; como numa visita a uma velha casa repleta de coleções raras, aprecio este valoroso conjunto de páginas despejadas na estante pela inspiração da mesma escritora.
Assim me sinto ao ler os romances de Virginia Woolf, perto. Perto dela, de outros tempos, de outras pessoas. Então por isso ouso fazer um pedido, um pedido por Adeline, seu primeiro nome, forço aqui uma intimidade.
Peço a Deus, independente da religião, que perdoe Adeline por ter se afogado por sua própria inclinação. Acho que ela merece perdão, pois sendo uma antena a catalisar os sentimentos flutuantes que pairavam no ar; não suportou mais este dom.
Peço que não a coloque de castigo, (além do que sofria de depressão há anos). Ouso aqui chatear outros, talvez a Deus (mas sei que é clemente), peço então por Adeline. Mesmo que ela não queira.

terça-feira, 15 de novembro de 2011

estado do amor:

Ainda sob o impacto do livro Rumo ao Farol de VW, replico abaixo sua delicada descrição de um amor. (página 52)
"No momento em que ela os erguia (os olhos) e os via, sentia-se inundada pela que chamava de "estado do amor". Passavam (os Ramsay) a fazer parte do universo irreal, mas penetrante, que é o mundo visto através do amor. O céu se ligava a eles; os pássaros cantavam através deles. E, o que era ainda mais emocionante, além disso ela sentia - ao ver o Sr. Ramsay derrotado, retirando-se abatido, e a Sra. Ramsay sentada com James à janela e a nuvem  movendo-se e a árvore dobrando-se - que a vida, por ser composta dos pequenos incidentes insignificantes que uma pessoa vive um a um, se tornava contínua e completa, como uma onda que a tivesse alçado com ela e depois a lançado de novo na areia da praia ao quebrar-se."
(um suspiro meu;)

domingo, 13 de novembro de 2011

O Farol e O Livro

... acabei de ler Rumo ao Farol, de acordo com a descrição na língua do livro (Não a leia antes de ler todo o livro, senão vai ficar sabendo o final antes de poder apreciá-lo. Por que os editores fazem isto? É como se tivesse na entrada da sala do cinema o final do filme revelado... pode?)
... está na língua do livro que é unanimente o melhor trabalho de V W (Virginia Woolf ), agora sempre explico a abreviação, pois meu amigo Adriano falou que alguém pode achar que V W é a abreviação para Volkswagen...;)
... acho difícil afirmar que este é seu melhor livro, como escolher? impossível eu acho...
Abaixo sem mais delongas algo que refletiu o tempo que demorei para ler esta obra tão tão deliciosa.
(página 31) " Livros pensou (Sra. Ramsay) cresciam por si mesmos. Nunca tinha tempo para lê-los. Coitada! Nem mesmo livros que tinham sido dados e assinados pelo próprio poeta: "Para aquela cujos desejos devem ser obedecidos"... "À mais alegre Helena dos nossos dias"...Era vergonhoso confessá-lo, mas nunca os lera."

domingo, 21 de agosto de 2011

suspiro do vento e o dedo do sol

DO Livro Contos Completos " A Caçada"  (página 372)
"Suspirou o vento. E ventou forte pela sala. As janelas e portas não se encaixavam bem. De vez em quando um enrugamento, como um réptil, corria embaixo do tapete. Nos adornos do tapete, amarelos e verdes, repousava o sol, mas depois o sol se moveu e apontou um dedo zombeteiro para um buraco no tapete e parou. E aí foi em frente, o dedo lânguido mas imparcial do sol, para bater no brasão em cima da lareira - e iluminar suavemente o escudo; cachos de uvas; a sereia; e a lanças. Tornando-se a luz mais firme, miss Antonia ergue os olhos. Vastas terras, diziam , seu pessoal tinha tido - seus antepassados - os Rashleighs. Além-mar. Pelas bandas do Amazonas."

segunda-feira, 25 de julho de 2011

final

O final do livro Mrs Dalloway de VW. Nem todo final é triste.

" - Richard melhorou. Tens razão - disse Sally. - Vou falar com ele. Vou dar-lhe boa-noite. Que importa o cérebro - disse Lady Rosseter, levantando-se -, comparado com o coração?
- Eu também vou - disse Peter,mas deixou -se ficar sentado, um momento. Mas que terror é este? pensou consigo. Que êxtase me vem? Que é que me enche de tão extraordinária excitação?
É Clarissa, descobriu.
Pois ela ali estava. " (pág. 180)

domingo, 26 de junho de 2011

livros.

No livro O Quarto de Jacob de Virginia Woolf uma bela descrição sobre ... livros.

"Aprecio livros, cuja virtude está concentrada numa página ou duas. Aprecio frases que não se movem, ainda que assoladas por exércitos. Aprecio palavras duras - tais eram os pontos de vista de Bonamy, que lhe conquistaram a hostilidade daqueles cujo gosto se volta inteiro para as vegetações frescas da manhã, que erguem a janela num ímpeto e encontram as papoulas espalhadas ao sol, e não conseguem conter um grito de júbilo diante da espantosa fertilidade da literatura inglesa." (pág. 152)

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Felicidade;

Do conto Felicidade do livro Contos Completos.
Com você a reflexão sobre a Felicidade de VW.

"Totalmente sozinho", repetiu mrs. Sutton. E disse que era isso que ela não podia entender, num desesperado arremesso de sua cabeça coroada por cabelo escuro brilhante - ser feliz estando totalmente só.
"Sim", ele disse.
Na felicidade há sempre essa exaltação espantosa. Não é animação; nem arroubo; nem louvor, celebridade ou saúde (ele não conseguia andar três quilômetros sem se sentir estafado), é um estado místico, um transe, um êxtase que, embora ele fosse ateu, cético, não batizado e tudo mais, tinha, suspeitava, certa afinidade com o êxtase que transformava homens em padres, que levava mulheres no vigor da mocidade a se arrastar pelas ruas com rufos engomados que mais pareciam ciclames rodeando seus rostos e lhes empedrava os olhos e os lábios; mas com uma diferença; àqueles, isso aprisionava; a ele punha em liberdade. Deixava-o livre de toda dependência de qualquer um e qualquer coisa. (pág. 254) 

segunda-feira, 6 de junho de 2011

América do Sul

Do livro A Viagem um trecho sobre a América do Sul que pode ser violenta como dizem mas continua bela.

Com vocês a América do Sul de VW.

" Um depois do outro, saíram todos para o espaço plano no topo e pararam ali, tomados de admiração. Contemplavam um espaço imenso diante deles - areias cinzentas transformando-se em floresta, floresta fundindo-se em  montanhas e montanhas lavadas pelo ar - as infinitas distâncias da América do Sul. Um rio cruzava a campina, plano como a terra e parecendo parado. O efeito de tanto espaço era bastante assustador no começo. Sentiram-se muito pequenos, e por algum tempo ninguém disse nada. Evelyn então exclamou: - Esplêndido." (pág 204)

sábado, 4 de junho de 2011

As flores de Mrs. Dalloway

O personagem Clarissa Dalloway do livro Mrs. Dalloway apareceu a primeira vez no primeiro livro de Virginia Woolf (A Viagem).
É um personagem so charming!
Com vocês as flores de Mrs. Dalloway:

"Mrs. Dalloway disse que ela própria iria comprar as flores.
Quanto a Lucy, já estava com o serviço determinado. As portas seriam retiradas dos gonzos; em pouco chegaria o pessoal de Rumpelmayer. Mas que manhã, pensou Clarissa Dalloway - fresca como para crianças numa praia!
Que frêmito! Que mergulho! Pois sempre assim lhe parecera quando, com um leve ringir de gozos, que ainda agora ouvia, abria de súbito as vidraças e mergulhava ao ar livre, lá em Bourton. Que fresco, que calmo, mais que o de hoje, não era então o ar da manhãzinha; como o tapa de uma onda; como o beijo de uma onda; frio, fino, ..." (pág. 11)

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Teatro!


O livro Entre os Atos (acho que o último de Virginia Woolf)  trata-se da representação de uma peça de teatro. Sexta tem um clamor para o teatro, não acham?

Com vocês Entre os Atos de VW:
"As notas musicais se extinguiram.
Era esse o final? Os atores relutavam em partir. Retardavam-se, misturavam-se uns aos outros. Budge, o policial, conversava com a Rainha Elizabeth. A Idade da Razão confraternizava com a parte dianteira de um burrico. E a Sra. Hardcastle abria as dobras de sua saia de crinolina. E a pequena Inglaterra, ainda criança, chupava uma pastilha de hortelã. Todos representavam o papel ainda não representado que lhes era conferido por seus trajes. Eram belos - e a beleza os revelava. Seria efeito da luminosidade? Dessa luz branda, fanada, cândida mas penetrante do entardecer, que revela profundezas na água e torna radiantes até mesmo os tijolos alaranjados de um bangalô?
- Vejam - sussurrava a plateia. - Vejam, Vejam. - E aplaudiram mais uma vez; os atores juntaram as mãos e curvaram-se.
A velha Sra. Lynn Jones, procurando sua bolsa suspirou:
- Que pena... Eles têm mesmo de mudar de roupa?
Mas estava na hora de arrumarem tudo e partirem."  (Pág.140)

quinta-feira, 2 de junho de 2011

uma dama da moda por VW

No livro O Quarto de Jacob Viriginia Woolf dá sua opinião sobre uma dama da moda.

"Uma dama da moda viaja com mais de um vestido, e se roupas brancas combinam com as horas matinais, talvez amarelo-areia com bolas púrpura e chapéu negro, e um volume de Balzac, combinem com com a noite. Era assim que ela estava vestida no terraço, quando Jacob chegou. Estava linda. Meditava com as mãos cruzadas, parecia escutar o marido, parecia observar os camponeses descendo com lenha às costas, parecia notar que a colina mudava de azul para negro, parecia discriminar entre verdade e falsidade, pensou Jacob, que, de repente, cruzou as pernas, notando como suas calças estavam puídas.
- Ele tem um ar muito distinto, decidiu Sandra." (pág. 157)

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Noite de Festa

Do livro Contos completos de VW.

Com vocês Noite de Festa!
"Ah, mas vamos esperar um pouco! - A lua está no alto; o céu, aberto; e lá, erguendo-se numa elevação contra o céu, com árvores por cima, está a terra. As nuvens prateadas e fluídas contemplam ondas do Atlântico. Na esquina da rua, o vento sopra leve e me levanta o casaco, estendendo-o delicadamente no ar antes de o deixar curvar-se e cair, como o mar que agora engrossa para rebentar nos rochedos e depois se afasta de novo....
Doce é o ar da noite. As criadas deixam-se ficar ao redor da caixa de correio ou namoram na sombra da parede onde a árvore derrama sua chuvarada escura de flores. Tal como na casca da macieira as mariposas tremem sugando açúcar pelo longo filamento negro da probóscide. Onde estamos? Que casa pode ser a casa da festa? Todas essas são pouco comunicativas, com suas janelas cor-de-rosa e amarelas. Ah - dobrando a esquina, ali no meio, lá onde a porta está aberta -, espere um momento. Vamos observar as pessoas, uma, duas, três, que se precipitam na luz como mariposas vão de encontro ao vidro de uma lanterna que ficou no chão da floresta. Eis um táxi que passa depressa para o mesmo local. Dele desce uma dama volumosa e pálida, que entra na casa; um senhor vestido para a noite, em preto e branco, paga ao chofer e a segue, como se ele também estivesse muito apressado. Venha, porque senão nos atrasamos..." (pág. 126)
" A sala está repleta de figuras vividas, contudo insubstanciais, que se postam eretas à frente de prateleiras listadas por inumeráveis volumezinhos; cabeças e ombros maculam quinas de molduras quadradas com douração; e a massa de seus corpos, lisos como estátuas de pedra, conglutina-se contra uma coisa cinzenta, tumultuosa, brilhante também, como que tendo água dentro, além das janelas sem cortinas." (pág 126)

terça-feira, 31 de maio de 2011

Segunda ou terça

Este é um pequeno conto do livro Contos Completos de Virginia Woolf chamado Segunda ou terça. (bem apropriado, não acham?)

Com vocês Segunda ou terça!
" Preguiçosa e indiferente, arredando espaço de suas asas com a maior facilidade, e sabendo o caminho, a garça passa embaixo do céu por sobre a igreja. Branco e distante, absorto em si mesmo, infinitamente o céu cobre e descobre, fica e se afasta. Um lago? Apague logo sua margem! A montanha? Oh é perfeita - durando ao sol sua encosta. Ora desce, descai. E depois samambaias, ou penas brancas, incessantemente...
Desejando a verdade, à espera dela, destilando laboriosamente algumas palavras, desejando sem parar - (parte um grito da esquerda, depois outra à direita. Movem-se rodas que divergem. Ônibus se aglomeram em conflito) - sem parar desejando - ( O relógio assevera com doze badaladas distintas é meio-dia; escamas de ouro se desprendem da luz; crianças se embolam)..." (pág 185)
" Preguiçosa e indiferente a garça retorna; o céu cobre com véu suas estrelas;  depois desnuda-as. " (pág. 186)

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Esses jornais...

No livro O Quarto de Jacob, Virginia Woolf faz uma descrição bem atual sobre esses jornais!

" Esses jornais rosados e esverdeados são tênues folhas de gelatina comprimidas à noite sobre o cérebro e o coração do mundo. E assumem a impressão de tudo. Jacob punha os olhos nisso. Uma greve, um assassinato, futebol, cadáveres encontrados; vociferação de todas as partes da Inglaterra ao mesmo tempo. Que miséria esse jornal não ter nada melhor a oferecer a Jacob Flanders! " (pág. 108)

domingo, 29 de maio de 2011

outono;

O verão é; o inverno é; a primavera é; o outono é o lado doce da espera. Vocês não acham?
No livro Orlando de Virgiinia Woolf , com a bela tradução de Cecília Meireles, temos a visão do camaleônico personagem  Orlando sobre o outono.

" Mas em quem se podia apoiar? Fazia essa pergunta aos ventos do bravio outono. Porque era em Outubro e havia umidade, como de costume. Não no arquiduque; desposara uma grande dama, e havia muitos anos que caçava lebres na Romênia; nem no sr. M.: tinha-se tornado católico; nem no marquês de C.: fazia sacos em Botany Bay; nem no lorde O.: havia muito tempo que fora comido pelos peixes. De uma ou de outra maneira, todos os seus antigos admiradores tinham desaparecido, e as Nells e as Kits de Drury Lane, muito embora ela as favorecesse, dificilmente serviriam de apoio.
- Em quem -, perguntava, lançando os olhos às nuvens, entrelaçando os dedos, ajoelhando-se no umbral da janela, como a verdadeira imagem da feminilidade suplicante, - em quem me posso apoiar?- Suas palavras formavam-se por si mesmas, suas mãos se entrelaçavam por si mesmas, involuntariamente, como a pena escrevera por seu livre arbítrio. Não era Orlando que falava: mas o espírito de uma época. Fosse, porém,o que fosse, ninguém respondia. Os gralhos, revolviam-se por entre as violáceas nuvens de outono. A chuva parara, finalmente, e havia pelo céu uma irisação que a tentava a pôr o chapéu de plumas e os sapatinhos de cordões e a dar uma volta antes do jantar." (pág. 164)

sábado, 28 de maio de 2011

Será que amanhã vai chover?

No mesmo livro Rumo ao Farol, considerado a principal obra de Viginia Woolf ((( acho tão difícil escolher))), uma outra previsão do tempo.

Com vocês previsão do tempo 2 de VW.
" - Mas o dia não ficará bom - disse o pai, parando em frente à janela da sala de visitas.

(foto Sandra Silva)
 Se houvesse um machado, um atiçador, ou qualquer outra arma à mão que abrisse uma fenda no peito do pai e por onde a vida escorresse, James a teria empunhado naquele instante. Tais eram os extremos de emoção que O Sr. Ramsey despertava no íntimo dos filhos, apenas com sua presença. Ali estava: de pé, o perfil agudo como uma faca e estreito como sua lâmina, sorrindo sarcasticamente - não apenas pelo prazer de desiludir o filho e lançar sua mulher (que era mil vezes melhor do que ele, pensou James) no ridículo, mas sobretudo por causa da certeza íntima que tinha da exatidão dos seus pensamentos. O que dizia era verdade. Era incapaz de mentir: nunca interferia em alguma coisa ou se pronunciava de modo a dar um pouco de prazer a qualquer mortal, e muito menos a seus filhos, que, desde a infância, ficavam sabendo que a vida é árdua, os fatos inflexíveis, e que a passagem para essa terra fabulosa onde nossas esperanças mais brilhantes se extinguem e nossas frágeis críticas malogram na escuridão exige, acima de tudo - concluiria o Sr. Ramsay, empertigando-se e franzindo os olhos azuis na direção do horizonte -, coragem, lealdade e perseverança.

- Mas talvez fique bom, pelo menos espero - disse a Sra. Ramsay..." (pág 8) 

sexta-feira, 27 de maio de 2011

Será que vai fazer sol?

O livro Rumo ao Farol de Virginia Wollf tem o primeiro parágrafo mais certeiro e encantador que já li.

Com vocês a previsão do tempo com VW.
"- É claro que amanhã fará um dia bonito - disse a Sra. Ramsay. - Mas vocês terão que madrugar - acrescentou.
Essas palavras trouxeram uma extraordinária alegria a seu filho, como se a excursão já estivesse definitivamente marcada. Após a escuridão de uma noite e a travessia de um dia, o desejo - por tantos anos aspirado - era agora tangível.

James Ramsay, sentado no chão, enquanto a mãe falava, recortava gravuras do catálogo das Lojas do Exército e da Marinha. Mesmo aos seis anos de idade, pertencia ao número daqueles que não conseguem separar um sentimento do outro, mas, ao contrário, deixam que as expectativas futuras - com suas alegrias e tristezas - toldem o que no momento está ao alcance da mão. (pag´. 7)"


chuva,

Eu gosto de chuva. Minha mãe acha um gosto meio estranho; acho que Virginia Woolf gostava da chuva também. Abaixo trechos que trazem pingos de chuva na obra de Virginia Woolf do livro Contos Completos.

Com vocês a chuva de VW.


"Ou bem a luz caía no dorso liso e acinzentado de uma pedrinha, ou bem nas costas de um caracol, sobre sua concha de veios pardos circulares, ou ainda, caindo numa gota de chuva, expandia com tal intensidade de vermelho, azul e amarelo as paredes finas da água, que se esperava que fossem rebentar e sumir. " (Conto Kew Gardens pág. 115)

"O vento ruge na alameda. As árvores encurvam, dobram-se de variadas maneiras. O luar se esparrama e respinga forte na chuva. Mas direto da janela vem o facho de luz. A vela queima tesa e quieta. Pervagando pela casa,a brindo as janelas, cochichando para não nos despertar, o casal de fantasmas procura sua alegria....
... O vento sopra, a chuva escorre prateada no vidro." (Conto A casa Assombrada pág 164)

quinta-feira, 26 de maio de 2011

política com pitada de esperança.

Este pequeno trecho de Mrs Dalloway a política presente na recepção da protagonista, em Londres, no início do século XX. Sempre há discordâncias, entretanto a história e a ficção apontam: o melhor caminho vence.
Vanessa de Redgrave na versão para o cinema.


Com vocês uma pitada de política em Mrs. Dalloway.
" E sir William, que parecia muito distinto, com seus cabelos grisalhos e seus olhos azuis, confirmou-o; mas não tinham podido resistir à tentação. Estava falando com Richard, provavelmente a respeito dessa lei que desejavam fazer passar na Câmara dos Comuns. Por que sentira uma crispação, à vista daquele homem, falando com Richard? Parece que de fato era, um grande médico. Um homem no apogeu da sua carreira, poderoso, um tanto gasto. Pois cumpria considerar os casos que se lhe apresentavam: gente nos últimos degraus de decadência; gente às portas da loucura; maridos e mulheres. Tinha de resolver problemas terrivelmente difícies." (pág 170)

"Quanto ao primeiro-ministro, fora mesmo muita bondade sua, sentia-o Clarissa, ter comparecido à festa. E, ao acompanhá-lo pelo salão, com Lady e Peter presentes e Richard muito satisfeito, e toda aquela gente talvez inclinada à inveja, sentira ela a embriaguez do momento, essa dilatação dos nervos do próprio coração, que parecia palpitar, crescer, elevar-se... sim, pois afinal era isso o que os outros sentiam; pois, embora gostasse daquilo e o sentisse espicaçá-la e estimulá-la, o fato é que aquelas aparências, aqueles triunfos (que o querido Peter, por exemplo, a julgasse tão brilhante), tudo eram coisas completamente ocas; coisas de fora, não do coração; podia ser que estivesse ficando velha, mas na verdade não a satisfaziam mais como de costume..."  (pág 162)
Esta edição da Nova Fronteira (capa acima) tinha um erro medonho. Ao invés das datas corretas faziam referência aos anos de 1960 e 1980. Me confundiu a leitura!! Avisei a editora na época mas não sei se corrigiram.


quarta-feira, 25 de maio de 2011

Homenagem as florestas brasileiras

Virginia Woolf que nunca esteve aqui descreve a Floresta Amazônica de um jeito singular. Neste dia em que os deputados colocam nossas florestas em risco uma homenagem a esta vegetação que nos protege. Viva as florestas!! Dilma, veto já!! Do livro A Viagem a descrição das nossas florestas por Virginia Woolf.
" Quando passaram para a profundeza da floresta, a luz ficou débil, e os rumores do mundo comum foram substituídos pelos estalos e suspiros que sugerem ao viajante numa floresta que ele está caminhando no fundo do mar. A trilha estreitou-se e dobrou; era beirada por densas trepadeiras, que se enroscavam em nós de árvore em árvore, e arrebentavam aqui e ali em flores vermelhas em formato de estrela. Os suspiros e estalos acima eram rompidos vez ou outra pelo grito dissonante de algum animal espantado. A atmosfera era abafada e o ar lhes chegava em lânguidos bafos de perfume. A vasta luz verde era rompida aqui e ali por um sol redondo de um amarelo puro, que caía numa fenda no imenso guarda-sol verde no alto, e nesses espaços amarelos borboletas vermelhas e pretas giravam e pousavam." (pág.  403)

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Um casal de fantasmas

Virginia Woolf no seu conto Casa Assombrada do livro Contos Completos dá uma descrição de roçar a alma sobre como vivem os fantasmas. Neste caso um casal unido para sempre. Para quem quer começar a ler VW recomendo este livro de contos, de cair o queixo))
Dá uma olhada. Com vocês os fantasmas de Virginia Woolf.
" A qualquer hora que você acordasse havia alguma porta batendo. De quarto em quarto eles iam, e de mãos dadas, erguendo aqui, abrindo ali, certificando-se - um casal de fantasmas." (pág. 162)
" Eles chegam mais perto; param na entrada. O vento sopra, a chuva escorre prateada no vidro. Nossos olhos se toldam; não ouvimos passos ao lado; não vemos mulher alguma abrindo sua fantasmal vestimenta. Já ele protege o lampião com as mãos. "Olhe só", sussurra. "Dormem a fundo. Com amor nos lábios"...
Dobrando-se, mantendo acima de nós seu lampião de prata, longa e profundamente eles olham. Longa é a pausa que fazem. O vento impele certeiro; a flama enverga fragilmente. Fachos fortes de luz cruzam pelo chão e a parede e, ao se encontrarem, mancham as faces que se dobram; as faces que ponderam, as faces que revistam os dormentes e buscam a oculta alegria.
"Em segurança, em segurança", bate orgulhoso o coração da casa.  Muitos anos...", suspira ele. "De novo você me achou." "Aqui", murmura ela, " dormindo; no jardim, lendo; rindo , rolando maças no sótão. Foi aqui que nós deixamos nosso tesouro..." Dobrando-se, sua luz ergue em meus olhos as pálpebras. "em segurança! em segurança! em segurança!", bate descontrolado o pulso da casa. E eu, despertando, grito: "Oh, é isto o seu - tesouro enterrado? A luz no coração." (págs. 164, 165)

domingo, 22 de maio de 2011

Vamos começar A Viagem?

A Viagem (The Voyage Out ) primeiro romance de Virginia Woolf teve sua primeira edição em 1915. VW começou a escrever este livro em 1906 levou portanto alguns anos para publicá-lo. Uma esperança para escritores iniciantes como eu.)
Então vamos começar nossa jornada com a descrição de uma viagem... de navio.
Com vocês trechos do livro A Viagem.

" Agora moviam-se constantemente rio abaixo, passando pelos vultos escuros de navios ancorados, e Londres era um enxame de luzes com um dossel amarelo-pálido pousado em cima. ... Nenhuma escuridão jamais se instalaria sobre esses lampiões assim como nenhuma escuridão se instalara sobre eles em centenas de anos. Parecia assustador que a cidade devesse arder assim no mesmo ponto, para sempre; assustador pelo menos para pessoas que partiam para uma aventura no mar, encarando-a como uma colina circunscrita, eternamente acesa, eternamente manchada. Do convés do navio a grande cidade parecia uma figura agachada e covarde, um avarento sedentário." (pág 39)
Quadro do pintor Turner (Tate Galery)
" ... Mas as pessoas nos navios tinham uma visão igualmente singular da Inglaterra. Não apenas ela lhes parecia uma ilha, e muito pequena, mas uma ilha que encolhia na qual havia várias pessoas aprisionadas. Primeiro a gente as imaginava correndo por ali como formigas sem objetivo, quase empurrando umas às outras sobre a margem; e depois, quando o navio se afastava, a gente as imaginava fazendo uma alarido vão, que, por não ser ouvido, cessava ou se transformava em gritaria. Finalmente, quando não se via mais o navio da terra, ficava claro que as pessoas da Inglaterra eram totalmente mudas. A enfermidade atacava outras partes da Terra; a Europa encolhia, a Ásia encolhia, a África encolhia, a Ámerica encolhia, até parecer duvidoso que um navio jamais voltasse a topar com qualquer uma dessas pequenas rochas enrugadas. Mas por outros lado, uma imensa dignidade baixara sobre o navio: ele era habitante do grande mundo, que tem tão poucos moradores, viajando o dia todo pelo universo vazio, com véus baixados adiante a atrás. Era mais solitário do que uma caravana atravessando o deserto; era infinitamente mais misterioso movendo-se por seu próprio poder e sustentado por suas próprias fontes. O mar poderia lhe dar morte ou alguma alegria sem igual, e ninguém saberia de nada. O navio era uma noiva avançando para seu marido, uma virgem desconhecida dos homens; no seu vigor e pureza poderia ser comparado a todas as coisas belas, pois como navio tinha uma vida própria." (págs.59 e 60) 

PS: Se você se animar a ler este livro recomendo que pule o prefácio e só volte a ele depois da última página; não tem graça ler 548 páginas quando já se sabe o que vai acontecer com a protagonista, não é!?